sexta-feira, dezembro 10, 2004

...de Garret, em tantos de nós, ...



(João Leitão da Silva; n. 4 de Fev. 1799 - m. 9 de Dez. 1854)

Nos 150 anos da morte do português, vale a pena recordar as diversas facetas, quem sabe se não - em parte - antecipadamente pessoanas. O Garrett político é de um interesse tão actual que não o comentarei, remetendo para um Inédito saído ontem com o Público, que aqui vai na íntegra.

Da sua obra política, é bom espreitar a recolha - já com uns anos - da Editorial Estampa, Obras Completas de Almeida Garrett, n.º 6 (Obra Política - Escritos do Vintismo (1820-23)) e n.º 7 (Obra Política - Doutrinação da Sociedade Liberal (1824-27)). Neste último n.º, são especialmente interessantes os textos Da Europa e da América e de sua mútua influência na causa da civilização e da liberdade, e Carta de Guia da Eleitores em que se trata da opinião pública.
Mas notem, que de Garrett há em tantos de nós ...

"Carta da Almeida Garrett ao político e amigo Rodrigo da Fonseca Magalhães
"Pensa", escreve Garrett em 1846 ou 1847 ao seu amigo, nesta carta inédita que pertence à Biblioteca Nacional. "E se julgares que podemos com um acordo perfeito, íntimo, mas secreto, fazer algum bem a esta pobre terra, avisa das horas mais convenientes de te ver." Estava-se em plena Guerra da Patuleia, a sangrenta guerra civil que dividiu o país entre liberalistas e miguelistas, e Garrett oferece-se para ajudar. O "acordo", se existiu, manteve-se mesmo secreto. Não se sabe qual foi - se algum - o envolvimento de Garrett nos bastidores
5ª feira
[...]
Meu Rodrigo, aproveito esta ocasião para te pedir que estejas bem em guarda para te não deixares comprometer com certos sujeitos que nós sabemos. Olha que eles nada te podem dar, e se te pudessem dar alguma coisa, não ta davam. Se se chegam para ti é porque sabem que nada têm, e fazem de vampiros para viver do teu sangue. E depois uma de duas, ou te hás-de desfazer deles, e chamam-te traidor, ou os aturas e alienas de ti os verdadeiros valores. No meio destas ruínas em que está Portugal tu podes ter uma bela missão.
Isto é como o terramoto de 55: nós não o fizemos, tu não o fizeste. E o que se incarregar de levantar a cidade caída não é responsável pelo que a deitou abaixo. Esta opinião e modo de ver não é meu, é de muita gente, e poderemos fazê-lo ser do maior número se se for com tento e firmeza.
Tu bem sabes que eu não costumo oferecer-me para nada; mas também sabes que sou amigo verdadeiro e eficaz quando a consciência da razão e da alma se juntam às minhas simpatias pessoais. Eu digo a todos que não sou de políticas, e que abdiquei, mas a ti digo-te que escolhi de propósito e de longamão esta posição insuspeita porque vi do princípio que por bastante tempo outra era impossível com proveito público. Creio que me não inganei. Assim vejo todos, e com todos falo em negócios que de outro modo não são tratáveis.
Se vires que podemos falar sério e com proveito nestas coisas, e que convém, dize e falaremos. Os patuleus estão com mais senso do que os eu supunha.
Se se tenta alguma coisa, é preciso tentá-lo já, isto é, prepará-lo; e parece-me a mim que posso ajudar-te nalguma coisa, especialmente porque cuidam que o não pretendo.
Ora eu realmente para mim aqui nada quero.
Adeus. Pensa, e se julgares que podemos com um acordo perfeito, íntimo, mas secreto, fazer algum bem a esta pobre terra, avisa das horas mais convenientes de te ver. E tu bem deves saber que eu não sou poeta em prosa, e que todos valem mais que eu, menos em lealdade e certeza que ninguém mais que eu vale. Teu dedicado amigo
J B A
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