terça-feira, março 16, 2004

Vão ver outro.

Como não leio críticas de cinema em jornais, fui desavisado ver “A Paixão de Cristo”.
Confesso que os latins, hebraicos e aramaicos me causaram, de início, uma certa simpatia. Afinal, quantos realizadores americanos fazem filmes mudos em línguas bárbaras?
Alguns pormenores de produção também me entusiasmaram, de início (este filme ainda ganhará o Óscar para melhor guarda-roupa). Mas logo me pareceu um pouco exagerado que se dedicassem cerca de cinco minutos de filme ao caminho entre o Jardim das Oliveiras e o Templo, sobretudo quando nada se mostrava além de Jeshua enfardando como um louco, de uns romanos perplexos perante a cena e de Judas logo ter o castigo que merecia. Toma.
Pilatos não se decide, Herodes está mais interessado em levar no rabo, e aquele lá acaba por lavar dali as manápulas e ordenar o castigo: “Mas não o matem, estão a ouvir?”
Daí em diante, é escalão “Z”. O Eleito é chicoteado durante cerca de um quarto de hora ou vinte minutos: sangue, feridas, costelas à vista, sangue (enfim, imaginam o que se seguiu: feridas ...). O caminho para o cadafalso dura cerca de uma hora. Sangue ... É crucificado com todos os requintes que o cinema lhe deve: pregos, sangue ... um corvo arranca o olho de um dos ladrões... morre ... treme a terra ... ressuscitou ... genérico.
Nada. Este filme tem nada. É a coisa ao contrário. Imaginem que liam os “Sete Pilares da Sabedoria”, que conta a história de Lawrence da Arábia, e quando iam ver o filme gramavam duas horas e tal de Lawrence no Cairo, nas suas lucubrações tão conhecidas, mas cá deserto e beduínos nem vê-los (talvez uma curta cena de masturbação pelo meio do Omar Sharif, mas não mais de trinta segundos, junto a um poço seco).
E dizia o Mel Gibson que esta era a maneira como via e sentia a Paixão de Cristo: se é isto que sentes, meu amigo, tiveste sorte em fazer primeiro de “Arma Mortífera”...
Não vale o bilhete.