terça-feira, março 30, 2004

Voto em branco? ... com mostarda e ketchup, s.f.f.

As últimas intervenções do nosso José “Exemplo Magno do que É Escrever Bem Sem Vírgulas e Que Toda a Gente Cita por Forma a Legitimar-se Quando Nem Uma Porra de um Recado de Mercearia Sabe Escrever” (vocês sabem de quem é que eu estou a falar, como diria o nosso Prémio Móvel da Agricultura), demonstram uma pobreza franciscana, não dele, mas nossa.
Há dezenas de pessoas (em Portugal) que falam e escrevem sobre a questão do voto em branco como arma sistemática contra o sistema. Por sinal, pessoas que estudam o assunto, quer do ponto de vista da Sociologia, quer do ponto de vista da Ciência Política, e mesmo do Direito Político. Por sinal, pessoas que têm opiniões cientificamente fundamentadas sobre o assunto, e que vão m(u)ito além de afirmar “que sim, que há uma contradição, mas é apenas formal ...”.
Sem espanto, é preciso um curioso – sem desprestígio – para que a comunicação social dê relevo ao tema, e o espete pelas nossas goelas abaixo. Mas percebe-se: se não fosse assim não era possível fazer um embrulho tipo hamburger – tão fácil de comer quanto de servir e ter arrumado na prateleira, “sempre a sair”.
E ainda nos admiramos de perder massa cinzenta (ou crítica, como está na moda) para o estrangeiro.
Imaginem o que seria se amanhã o Dr. Pedro Santana Lopes nos viesse dizer que havia descoberto “uma coisa mágica”, que “Descartes errara” ou que há um “Sentimento de si”. Ouvi-lo-íamos em conferência de imprensa? Sentá-lo-íamos ao lado de especialistas sobre o assunto? (também não estou a ver de quem ...) E o que se pensaria dos jornais, TV’s e rádios que lhe dessem voz?

segunda-feira, março 29, 2004

Hijos de Puta

É o que apetece dizer depois de ler mais um triste relato. Aqui no Periscópio, infelizmente, também já lemos algo semelhante, só que desta vez os personagens têm outro papel: atentem!* Depois digam que se não é também um caso de terrorismo, neste caso nacional.

*via Um pouco mais de azul e Terras do nunca.

Vencedor do Concurso

Bom, já está! Depois de analisadas as trezentas e vinte e nove respostas, chegamos ao apuramento do seguinte vencedor: Urso Polar! A escolha foi bem difícil e até pensei que a caixa do correio fosse rebentar pelas costuras!, no entanto, graças a ajudas suplementares, tudo foi perfeito! Parabéns e obrigado ao Urso Polar pela vencedora resposta:

«1 - Sei.

2 - Tudo o que não cabe na mão é desperdício. Felizmente o Urso tem pata grande.

3 - Com dois dedinhos apenas

Se abrem as prisões

Se expõem os mais pequenos

ou libertam os melões.

4 - Um presente embrulhado só pode ter um fim. E, certamente, não é ficar dentro do embrulho.

5 - "Não há mulheres frígidas, há é más línguas".»*

*Urso Polar

quinta-feira, março 25, 2004

victoria's-secret.blogspot.com

Dado o agora manifesto, espontâneo e crescente interesse em seios por alguns dos nossos leitores, especialmente o nosso assíduo amigo Urso Polar, não hesitei um segundo em visitar a sua aconselhada e-loja, quiçá de eleição: a Victoria’s Secret.

Então a propósito de seios atentemos:

«(...) Comummente aceite por biólogos que o real objectivo evolucionário das mulheres terem seios é atrair os machos da espécie, os seios são uma das principais características sexuais secundárias.

Alguns biólogos acreditam que a forma dos seios femininos evoluíu como uma espécie de complemento estético na parte da frente da mulher, em compensação às formas das nádegas;

Outros acreditam que os seios evoluíram de uma forma a prevenir que os bebés não sufoquem enquanto mamam: uma vez que bebés não possuem uma mandíbula protuberante como outros primatas, o nariz poderia ser bloqueado por um peito feminino liso na hora da amamentação (de acordo com esta teoria, quando a mandíbula dos hominídeos ficou menor, os seios aumentaram de tamanho para compensar esta diminuição);

Contrariamente ao que se pensa, o tamanho dos seios de uma mulher não é indicativo de uma capacidade maior de produção de leite, porque na verdade as glândulas mamárias participam muito pouco no tamanho real dos seios — a maior parte do volume dos seios é de facto tecido conectivo e tecido adiposo. (...)»

Agora um pequeno teste aos leitores do Periscópio:

1. Sabem o tamanho do soutien da vossa namorada/mulher?
2. Qual o tamanho que têm como «fétiche»?
3. Qual a forma mais eficaz de desapertar um soutien?
4. Qual a necessidade de desapertar?

5. Comente a seguinte frase:

«mais vale um soutien nas mãos que dois a voar».

Podem enviar as vossas respostas até Domingo 28 para: periscopioquatro@portugalmail.pt. O júri será composto por mim próprio e restantes Periscópios. Da mais original, estrondosa, excêntrica e divertida maneira de responder às cinco perguntas sairá o vencedor!, que terá direito a um prémio bem como à publicação no Periscópio do teste resolvido (na Segunda 29). Vale!

Um pedido ao Urso Polar

Não pares com o polissiamento ortográfico.
Pode ser doloroso mas é fundamental. E até já se tornou divertido.

"A humidade quente da loucura"

O blusão de cabedal negro empoleirava-se nas costas da cadeira, aparentando sussurrar experiências e experiência de noites e noites brancas, esgotadas de cigarros hidratados por pequenos goles de água da montanha embalada na Via Longa. Mesmo sem o dono lá dentro mantinha a gola semi-levantada, com personalidade.
A história ia sendo contada em voz baixa, entre um mastigar e um gole, os olhos atentos ao redor. O sobrolho franzido não deixava abrandar o tom grave, e ela, ouvindo-o, percebia a cada palavra que só podia ser como ele dizia, como ele finalmente descobrira, a meio do trigésimo sétimo cigarro quando eram já três da manhã e estava só.
Mas havia pormenores que só esquematicamente podiam ser explicados. O blusão passou-lhe uma caneta para a mão. Falando ainda mais baixo, ilustrava traços e letras que ia depositando na toalha de papel, subtil mas habilmente escondidos pela garrafa de vinho, que convenientemente estava ainda pela metade, impedindo o translúcido: um conselho do blusão, que há anos o não deixava escorregar em qualquer descautela. Já lá iam mesmo muitos anos daquela vida.
Mas uma ou outra palavra escapava no eco dos talheres. O Cruz ... manchas, sim ...não eram dele ... isso prova-se ...o Pedroso, nem imaginas ... é aquele puto ... estão feitos ... eu pensava ... e fez-se-me um clik ... Os olhos passearam mais uma vez em torno dos pratos. O silêncio momentâneo: vinha o empregado com os cafés. Foi-se. ... agora vê lá ...
O vestido vermelho que ela escolhera para a ocasião não dava bem com as meias de renda, tantas vezes usadas sem lucro. O cabelo pintado, louro, fora cuidadosamente disposto, quase a bater os ombros. Só ouvia. Estava tão embevecida pela história, admirável, concluída, como pelo cheiro a frango assado que escorria das paredes, pisado e repisado. E não podia deixar de reconhecer que era brilhante a conclusão dele, depois de tantos meses de raciocínios truncados pela barafunda de factos novos, jornais, intrigas e horas mal dormidas.
Veio a conta. Deixaram o dinheiro no pires, e levantaram-se. Ele vestiu o blusão; ela olhou por cima do ombro e colocou a mala ao ombro. Olharam-se com um ar cumprido, de fim. Ele deixou-a passar, cavalheiro. Estavam cansados e precisavam de dormir. A excitação tinha-lhes aberto o apetite: o blusão cobiçava as meias de renda e a caneta pensava no vestido vermelho ... Mas não podia ser. Havia mesmo que dormir um pouco, porque no dia seguinte a papelaria abria às 9 em ponto e à dois dias que chegava em cima das dez; e os novos rolamentos que tinham vindo de Águeda para ser montados nas novas carruagens não podiam sê-lo sem que as juntas fossem limpas antes. Acabara a fantasia por esta noite mas amanhã ... poderiam ser outra vez quem quisessem ser.

Uma amiga

Caríssimos,
Visitem a nossa amiga Sara desassossegada: cinema, Piazzola, tudo de bom.
E não se deixem intimidar pelos olhos esbugalhados.

terça-feira, março 23, 2004

A Polémica

Curioso como a questão da eutanásia causa tanta celeuma também no Oriente Próximo.

terça-feira, março 16, 2004

Vão ver outro.

Como não leio críticas de cinema em jornais, fui desavisado ver “A Paixão de Cristo”.
Confesso que os latins, hebraicos e aramaicos me causaram, de início, uma certa simpatia. Afinal, quantos realizadores americanos fazem filmes mudos em línguas bárbaras?
Alguns pormenores de produção também me entusiasmaram, de início (este filme ainda ganhará o Óscar para melhor guarda-roupa). Mas logo me pareceu um pouco exagerado que se dedicassem cerca de cinco minutos de filme ao caminho entre o Jardim das Oliveiras e o Templo, sobretudo quando nada se mostrava além de Jeshua enfardando como um louco, de uns romanos perplexos perante a cena e de Judas logo ter o castigo que merecia. Toma.
Pilatos não se decide, Herodes está mais interessado em levar no rabo, e aquele lá acaba por lavar dali as manápulas e ordenar o castigo: “Mas não o matem, estão a ouvir?”
Daí em diante, é escalão “Z”. O Eleito é chicoteado durante cerca de um quarto de hora ou vinte minutos: sangue, feridas, costelas à vista, sangue (enfim, imaginam o que se seguiu: feridas ...). O caminho para o cadafalso dura cerca de uma hora. Sangue ... É crucificado com todos os requintes que o cinema lhe deve: pregos, sangue ... um corvo arranca o olho de um dos ladrões... morre ... treme a terra ... ressuscitou ... genérico.
Nada. Este filme tem nada. É a coisa ao contrário. Imaginem que liam os “Sete Pilares da Sabedoria”, que conta a história de Lawrence da Arábia, e quando iam ver o filme gramavam duas horas e tal de Lawrence no Cairo, nas suas lucubrações tão conhecidas, mas cá deserto e beduínos nem vê-los (talvez uma curta cena de masturbação pelo meio do Omar Sharif, mas não mais de trinta segundos, junto a um poço seco).
E dizia o Mel Gibson que esta era a maneira como via e sentia a Paixão de Cristo: se é isto que sentes, meu amigo, tiveste sorte em fazer primeiro de “Arma Mortífera”...
Não vale o bilhete.

É o que se chama "ter um Aznar de Zapatero"...

Desenganem-se aqueles que afirmam que a vitória do PSOE sobre o PP foi a vitória "da verdade sobre a mentira", da "paz sobre a guerra", da "sociedade sobre o neo-totalitarismo".
E desenganem-se aqueles que perguntam pela ETA e pela AL-QAEDA, pelos responsáveis do massacre, pelos culpados.
A pergunta que deve fazer-se não é porque ganhou o PSOE e não o PP; porque perdeu o PP e não o PSOE. A pergunta que deve fazer-se é: porque não foram adiadas as eleições?
Deixando de parte os partidos mais pequenos - com mil perdões, pois é grande a questão -, porque estavam ambos, PSOE e PP, convictos de que manter as eleições no dia aprasado era a melhor opção para a democracia espanhola? Terá sido um fulgor instantâneo e verdadeiro de fazer finca-pé no funcionamento rijo das instituições? Impossível.
Em primeiro lugar, qualquer observador minimamente atento - mesmo qualquer pessoa de bom senso - prevê que, depois do sucedido e em cima do acontecimento, não poderia ser aceitavelmente racional qualquer voto no dia 14 de Março. Nem é necessário explorar cambiantes de psicologia social: qualquer acontecimento emocional que movimente e motive massas rouba racionalidade ao indivíduo, principalmente porque aumenta a ilusão de que a massa tem identidade, baralhada entre o "eu" e "os outros".
Em segundo lugar, ambos PSOE e PP demonstraram estar acima de uma certa emocionalidade quando adoptaram determinadas medidas ou posturas públicas: designadamente, o PP insistindo na culpabilização da ETA, e o PSOE resguardando-se nos comentários e ocultando Zapatero. Não pode, pois, afirmar-se que não houve frieza bastante no seio de qualquer dos partidos (o que não significa que não tenha havido desnorte).
O que seria verdadeiramente democrático? Esperar, acalmar, e não fazer de um acto que deve ter o mínimo de objectividade uma falsa epifania da democracia. Há muitas, é certo. E pode perguntar-se o que há de novo nisto?
O problema é, pois, a resposta: não há nada de novo. Tanto o PSOE como o PP viram de imediato as possibilidades políticas do acontecimento, da carnificina. O que salvou uns e condenou os outros é apenas isto: enquanto os outros tiveram que actuar - mal - porque tinham o poder nas mãos, os uns não tiveram que fazer nada a não ser proclamar a democracia. Estranha simbiose esta...
Vitória da "verdade sobre a mentira"? Da "paz sobre a guerra"? Da "sociedade sobre o neo-totalitarismo"? Não, meus caros. Apenas vitória de um partido sobre o outro, "the old-fashioned way".
Quando Nixon concorreu contra Lindon Johnson, este estava prestes a assinar a paz no Vietnam. Gente próxima de Nixon deslocou-se ao sueste asiático com uma mensagem tão específica quanto no interesse do povo americano: "Esperem por Nixon - com ele conseguem um acordo de paz mais vantajoso". E morreram mais uns milhares de soldados.
O jogo continua.

segunda-feira, março 08, 2004

A Costela

Neste dia internacional recordemos então o mito vivo que amamos: aquela que foi, aquela que é, aquela que será: a Mulher.

quinta-feira, março 04, 2004

Contenção de hospital

Uma paciente está deitada numa cama de enfermaria. Sofre de um cancro que lhe rompe as entranhas.
As dores são insuportáveis. O estômago não aguente comida alguma. Muitos dos dias, nem água lá cai sem provocar vómitos, que tanto são imediatos como surgem do nada, no meio da noite. Quase não consegue dormir.
A vontade de viver dá-lhe um rosto que em nada espelha o que lá vai dentro, seja acima seja abaixo do pescoço.
Os médicos esforçam-se por lhe dar a qualidade de vida possível nas circunstâncias. Ora o soro com analgésicos capazes de adormecer um elefante, ora um suplemento alimentar de aspecto aleitado - que não sei do que é feito mas recorda o eterno retorno à meninice. Tal suplemento é doseado por uma máquina de ar moderno. É feita uma transfusão de sangue que desintoxica e lhe devolve alguma cor de vida.
Um tubo que lhe chega ao estômago drena constantemente tudo aquilo que já não pode sair de outra forma, porque os intestinos funcionam, sim, mas sofrem de obstruções. Tem um saco para a defecação, directamente ligado ao intestino. O ânus já não funciona.
Enfim, há cuidados - e também descuidos. Mas não fazem esquecer a degradação humana a que todos podemos chegar.
Um dia, pela manhã, o médico, atencioso, faz a visita regular. Verifica todo o equipamento e o cumprimento de todas as medidas médicas que ordenou. Tudo está como devia de estar, e o sofrimento da paciente é aquele que já não pode ser aliviado.
Vinha acompanhado de um gestor hospitalar. Este, no cumprimento da sua função, profere a seguinte frase competente: "Mas é preciso isto tudo?".
O que terá pensado a paciente, que o ouviu?
É repugnante.